Eike Batista, empresário conhecido por seu império ‘X’ e subsequente queda, anunciou seu retorno aos negócios com um novo e ambicioso empreendimento: a ‘supercana’.
Este projeto visa transformar a produção de cana-de-açúcar para gerar combustível de aviação sustentável (SAF) e embalagens biodegradáveis, prometendo revolucionar o agronegócio e a indústria de energias renováveis.
A notícia, no entanto, foi recebida com reações divididas, oscilando entre otimismo e um profundo ceticismo do mercado.
O retorno de Eike Batista e a proposta inovadora da supercana
Após quase uma década longe dos holofotes, marcada pelo colapso de seu império e problemas legais, Eike Batista ressurge com a ‘supercana’. Este novo empreendimento foca em 17 variedades de cana-de-açúcar desenvolvidas por melhoramento genético convencional, com germoplasmas importados de países como EUA, França e Barbados.
O empresário alega ter garantido um investimento inicial de US$ 500 milhões (cerca de R$ 2,95 bilhões) de um fundo árabe, o Abu Dhabi Investment Group (Adig), captados por um fundo estruturado por Mário Garnero.
Diferentemente das iniciativas passadas de ‘cana-energia’, cujo foco era a queima para geração elétrica, a ‘supercana’ da BRXd (empresa responsável pelo projeto, cujo CEO é Luis Rubio) tem usos considerados ‘mais nobres’.
O etanol produzido será destinado à fabricação de SAF, e o bagaço, em maior volume, para a criação de plásticos e embalagens biodegradáveis, buscando atender à crescente demanda por soluções mais sustentáveis no mercado global.
As promessas de produtividade e a base tecnológica da supercana
Eike Batista e a BRXd afirmam que a ‘supercana’ é capaz de produzir de 2 a 3 vezes mais etanol por hectare e de 7 a 12 vezes mais bagaço por hectare do que a cana convencional. A variedade SC157070 é uma das mais destacadas entre as 17 desenvolvidas. O projeto conta com o agrônomo Sizuo Matsuoka, figura central no desenvolvimento da tecnologia, com décadas de pesquisa em melhoramento genético de cana, inclusive em empresas como CanaVialis e Vignis.
Um dos desafios técnicos de variedades de cana com maior teor de celulose/bagaço é a sua dureza, que dificulta o processamento em moendas convencionais. Eike Batista, entretanto, argumenta que o projeto prevê o desenvolvimento de novas máquinas, maiores e mais reforçadas, para lidar com essa característica, justificando o investimento pela elevada produtividade prometida.
O histórico de ceticismo do mercado e os desafios técnicos
O retorno de Eike e seu novo projeto são marcados por um forte ceticismo do mercado. Seu histórico inclui a ascensão e o colapso do ‘império X’ no final dos anos 2000, com promessas de reservas de petróleo da OGX que foram drasticamente revisadas para baixo, levando à crise do grupo em 2013. O empresário chegou a ser o homem mais rico do Brasil, mas enfrentou prisões e condenações por crimes contra o mercado de capitais, além de ter parte do patrimônio bloqueado.
O setor canavieiro também tem suas próprias razões para o ceticismo. Grandes centros de pesquisa como o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) e a Embrapa não focam mais em ‘cana-energia’, e empresas como a Cosan (Rubens Ometto) já testaram e abandonaram projetos semelhantes por não se mostrarem economicamente viáveis na prática.
Desafios como o baixo poder calorífico (se usada para energia) e a dificuldade de processamento da cana mais dura com maquinário convencional já levaram empresas como a GranBio a reorientar seus esforços após investir em etanol de segunda geração a partir de cana-energia.
A própria empresa Vignis, fundada pelo agrônomo Sizuo Matsuoka e na qual Eike investiu em 2015, entrou em recuperação judicial em 2017, indicando dificuldades anteriores com a viabilidade comercial da tecnologia.
Financiamento cronograma e as projeções ambiciosas do projeto
Além do investimento inicial de US$ 500 milhões, o projeto prevê o lançamento de um token $EIKE para captar mais US$ 100 milhões, com promessa de 10% dos lucros futuros para os detentores. O cronograma de expansão é ambicioso:
- Cultivo experimental em usina de referência em Araras (SP).
- Plantio de 50 hectares no norte do Rio, próximo ao Porto do Açu, em 2025.
- Construção de três fábricas de processamento.
- Previsão de produção de embalagens a partir de 2026 e SAF a partir de 2028.
- Meta de 70 mil hectares plantados e a construção de uma usina de SAF até 2031.
Projeções financeiras estimam, para o 4º ano do primeiro módulo, um EBITDA de US$ 5,9 bilhões e um valuation de US$ 63 bilhões. A BRXd destaca que a ‘supercana’ é o que anima a empresa no mercado sucroenergético, visando o mercado de SAF como uma oportunidade para se desvincular da volatilidade do preço do etanol.
Supercana de Eike Batista: promessa x realidade
O projeto da ‘supercana’ de Eike Batista representa uma nova e audaciosa tentativa de reerguer seu império, apostando em um segmento de alto valor agregado com grande potencial de crescimento, como o combustível de aviação sustentável e os bioplásticos.
Embora a proposta se mostre atraente sob a ótica da sustentabilidade e inovação, ela esbarra no histórico conturbado do empresário e nos desafios técnicos e econômicos que a indústria canavieira já enfrentou com variedades similares.
O sucesso dependerá da capacidade de superar o ceticismo, entregar os resultados de produtividade e viabilidade industrial prometidos e, fundamentalmente, de reconstruir a confiança do mercado. A ‘supercana’ ainda precisa resistir à prova do tempo para provar que não será mais um dos planos grandiosos que não se concretizaram.